terça-feira, novembro 22

Mendicância


    Cerveja. Eu deveria, agora, estar tomando uma garrafa de cerveja. Gelada ou não, foda-se. Ou um destilado qualquer. Qualquer. É o álcool que me importa. É meu remédio, eu sei. É ele quem me separa da mais completa loucura, que me tira da realidade, porque, convenhamos, na realidade ninguém consegue viver. Ou consegue? Sou só eu, então? Tudo bem, sou só eu então. Foda-se. Que me julguem, que me excluam de suas vidas de merda, que se fodam. Apenas não me tirem o álcool. Não. Eu preciso dele. Preciso disso, tanto quanto esse povo imbecil precisa do futebol, do carnaval ou da merda do samba.
    É por isso que saí daí de onde você está, de onde você vive, de onde você mora; porque não tem álcool, porque não tem vida, porque não tem nada.
    Ou então que me internem logo de uma vez em uma instituição qualquer para loucos e me dopem, me injetem algo nas veias que me retarde as ideias. Ou me amputem o cérebro, lobotomizem-me, façam algo que o valha, algo que preste, que sirva para algo. E me julguem, apontem o dedo, estou aqui para isso. Sou a escoria mesmo e sei que sou. E gosto de ser. E convivo bem sendo a escória. Sou seu mártir, seu exemplo negativo, sou tudo aquilo que você não pode ser e estou aqui para lhe lembrar o que você seria se você não se controlasse, se não tomasse seus remédios, se não fosse ao seu showzinho de MPB de merda. Estou aqui, sou o Cristo do novo milênio  Sou sua salvação, torta, errada e prostituída. Sou todas as mazelas que você quiser que eu seja, desde que me sirvam mais uma dose, e aí estaremos bem.
    Deixe-me que me embriague mais uma vez, outra vez e sem parar. Que meu fígado se apodreça e sangre-me todo por dentro. Foda-se.
    Não precisa nem mesmo me dizer seu nome. Não o quero saber. Não quero sua compaixão, sua dó, seu carinho. Engula sua necessidade de cuidar dos outros, de cuidar de mim. Enfie seu altruísmo esfíncter adentro até que ele saia em sua garganta. Vomite tudo. Vomite-me.
    Eu te odeio, seu filho da puta. Eu te odeio.

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