terça-feira, novembro 1

Rotina

Ela acorda cinco minutos antes de abrir os olhos, procurando algum motivo para não ficar na cama o resto da manhã. Respira fundo quando só descobre obrigações de uma vida adulta fracassada. E tem contas a pagar.
Levanta da cama. Calmamente dá uma volta na cama, gira pelo quarto. O despertar vem devagar. Vai a até a janela, mas não abre as cortinas – ainda está escuro lá fora de qualquer jeito.
No banheiro, sente o chão gelado com a sola dos pés e volta atrás de seu chinelo. Liga o chuveiro e espera a água esquentar um pouco antes de entrar box adentro. Em trinta minutos, o vapor se solidifica nas paredes e embaça o espelho. Ela desliga o chuveiro e se enxuga, delicadamente.
De volta ao quarto, sentada sobre a cama, passa cuidadosamente os devidos cremes por todo seu corpo. Perfuma-se. Lingeries confortáveis e viva a humanidade que não lhe dá a devida atenção, que não lhe quer comer!
Não tem tempo ou ânimo para o café da manhã que tomaria nem se morasse em um hotel três estrelas. Dois biscoitos água e sal e uma maçã lhe forram o estômago. Levando a mochila com o velho notebook e sua bolsa, desce até o carro.
As ruas ainda estão acordando. Ela nem lembra de ligar o rádio; segue em silêncio.
Em vinte e alguns minutos, já com todas as ruas despertas, ela chega ao escritório. Na subida até a sala, serve-se de um grande copo com café. Vai direto para a cobertura do prédio fumar seu primeiro cigarro do dia. Ainda não tem ninguém ali.
Quando senta em sua mesa, abre o computador, procura por e-mails. Hoje é sexta-feira e ela procura alguma coisa que lhe tire da dura rotina do abandono e da solidão que lhe aplaca em quase todos os finais de semana. Sozinha não sai, não consegue. Escolhe três ou quatro programas culturais pinçados de um dos jornais e envia e-mail para seus contatos convidando a todos. Alguém tem que ceder: ou aceita a sua sugestão ou a convida para o tal do outro programa que todos sempre tem para fazer.
Perto da hora do almoço, toda sua lista de contatos respondeu seu e-mail. Ninguém vai, é o que dizem. Em nada. E vão fazer o quê? Cadê o convite que lhe tire de casa?
Não vem. Não tem. Não existe.
Hoje é sexta-feira e ela vai passar o final de semana inteiro sozinha.
Hoje é sexta-feira. Mas, Deus!, bem que podia ser segunda.

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